Uma Nova Luz
Entrou uma enfermeira no quarto, senhora típica (aperaltada, um bocado histérica e com cara de quem era capaz de pedir a alguém o mundo e julgar mesmo recebê-lo) os seus saltos faziam um barulho irritante e as palavras que ela pronunciaria a seguir seriam ainda mais.
-Ai! Odeio mesmo ver gente a morrer. Coitada desta… - disse a mulher.
E saio abanando a cabeça.
“ Hoje estava a chover o que me fazia feliz, adoro chuva, o cheiro a terra e o saber que estou abrigada dentro dos edifícios, dá-me a sensação de segurança que esteja a chover mas que as gotas não me consigam sequer tocar.
No intervalo entre a primeira e a segunda aula a Jéssica convidou-me para irmos a uma discoteca sábado apesar de termos de ir com irmão dela que a vai vigiar o que é imensamente irritante. Segundo ela o irmão não a deixa beber uma gota o que torna as coisas ainda piores.
Na segunda aula passei-me (como podia não me passar: era matemática). A s’tora fez-nos pensar até à última milésima de segundo. Baldei-me com a Jéssica o resto do dia, fumámos um cigarro jogámos cartas, fomos para a casa da Jéssica e jogámos videojogos depois eu fui para minha casa onde estava a minha mãe a cozinhar o jantar e os meus irmãos a fazer desenhos.
A minha mãe é empregada de mesa mas é muito irregular está sempre a perder o emprego ela até se esforça mas o monstro do azar está colado a ela e por mais oque o esforço a abane ele não despega. O meu pai é agente de viagens e ainda não voltou do trabalho, eu acho que ele anda a trair a minha com uma cabra lá do trabalho mas deixo esses pensamentos apena para mim. Os meus irmãos gémeos têm seis anos e único problema deles é que tem imensa energia e deves em quando dá-lhes para a gastarem a chatear-me mas são uns miuditos muito fixes.
Fui à procura do meu telemóvel na mala que tinha levado para a escola e após muito remexer percebi que ele não estava lá, bolas! Devia tê-lo deixado esquecido na casa da Jéssica. Olhei para o relógio, eram só seis da tarde.
Dei um salto à casa da Jéssica para o ir buscar e conheci os pais dela. Quero dizer, o pai e a namorada, reconheci os olhos verdes e brilhantes no pai dela mas não gostei dele, era muito frio e distraído e não parecia ligar à filha e à namorada pouco mais ligava. A namorada era a mulher mais histérica que eu já alguma fez conheci e ria-se de quase tudo o que lhe aparecia à frente mas era muito bonita. Também conheci o irmão da Jéssica que era tão frio como o pai apesar de estar com os pés bem firmes em terra e também não gostei dele.
Tive de carregar o telemóvel quando cheguei a casa e quando o liguei vi que tinha uma chamada não atendida do… Dário! Felizmente ele era real!
Telefonei-lhe de volta.
-Estou…
-Oi. Fala a Teresa. Ainda te lembras de quem sou, aquela que…
-Sim, sim. Lembro-me.
-Tu telefonaste-me, certo?
-Sim, sim. Telefonei. – disse ele imitando a maneira como tinha dito a outra frase.
-Pára com isso.
-Sim, sim. Paro.
-Não tens graça.
-Já parei. Só queria saber de ti, estava à espera que telefonasses.
-Eu… Não tinha saldo. O meu pai só me carregou o telemóvel hoje. Eu estou bem, e tu?
-Também. Não fizeste disparates pois não?
-Não teve graça.
-Estava a falar a sério.
-Não preciso que cuides de mim.
-Então, também não é preciso ficares assim.
-Desculpa. Olha, podes vir comigo e com uma amiga minha a uma discoteca. Queres?
-Sim. Quando?
-Sábado às nove. Podes estar a essa hora naquele jardim em que estivemos juntos.
-Ok. Adeus.
-Adeus.
Carreguei no botão vermelho e depois telefonei à Jéssica para lhe dizer que levava um amigo.
Ainda me lembro de como a noite estava quente e como era lua cheia. Como sempre, tinha vestido qualquer coisa ao acaso para vestir e não me tinha preocupado muito com o cabelo. Sabia que fosse o que fosse que vestisse ou de que me maneira arranjasse estaria sempre bonita. Não me gabo disso em voz alta mas sei que sempre fui deslumbrante.
Quando cheguei ao jardim o Dário já me esperava. Acenei-lhe e fomos para a discoteca. Quando chegámos verificámos que a Jéssica e o irmão ainda não tinham chegado. O Dário pediu para esperarmos por eles lá fora.
Enquanto esperámos eu contei-lhe de como a Jéssica tinha de andar com o irmão atrás a verificar se ela não fazia asneiras. Ele perguntou-me porque é que eu achava que ela se drogava e eu só pude responder que nunca lhe tinha perguntado.
Passados poucos minutos eles chegaram, a Jéssica vinha afastada do irmão e embeiçada provavelmente porque ainda tinha esperança de convencer o irmão a ir-se embora e não tinha conseguido.
-Olá. – disse eu para a Jéssica – Este é o Dário.
-Olá. – disse ela virando-se para Dário e fazendo um sorriso encantador nada típico dela o que me espantou.
Quando o irmão da Jéssica se aproximou de nós sorriu e apresentou-se ele próprio dizendo que era irmão da Jéssica e que se chamava Manuel. Nem sequer o cumprimentei porque estava a tentar mostrar que estava do lado da Jéssica quanto à questão de ela não precisar de ninguém para tomar conta dela.
Entrámos e sentámo-nos ao pé do balcão não pedi nada para beber porque me senti mal por causa a Jéssica.
-Não sei porque é que me deixas vir para aqui e depois não posso beber um gole – reclamou a Jéssica.
O irmão ignorou-a. Começámos a conversar durante alguns minutos até que a Jéssica convidou o Dário para dançar e lá foram os dois.
Fiquei chateada porque percebi que a Jéssica estava a atirar-se a ele. Eu tinha-o convidado para o conhecer melhor não para isto!
Reparei que estava a ser observada pelo Manuel. Mergulhei nos olhos dele e perguntei-lhe:
-Porque é que és tão controlador com a tua irmã?
-Tu não percebes, é uma realidade que te parece estar longe mas à muita gente que morre por causa dessas coisas da droga e do álcool.
-Por amor de Deus como é que ela pode morrer por beber um bocadinho de vez em quando.
-Ela exagera em tudo. Se o pai a autorizar aposto que não haveria uma noite em que ela não chegaria a casa bêbada. Acredito que tu saibas quão provável é isso acontecer. Ela anseia tanto por estar alheia à realidade. E eu até compreendo… Ela gostava muito da mãe… Mas de qualquer maneira aquela catraia devia ter aprendido alguma coisa com a morte da mãe, mas não… Mesmo sabendo o risco que corre só quer estar alheia.
Calei-me. Que mais poderia fazer? Não fazia a ideia de como a mãe da Jéssica tinha morrido e não queria ter descoberto daquela maneira. Aliás nem sequer sabia bem se a mãe estava morta. Senti-me terrivelmente envergonhada. Procurei a Jéssica com o olhar mas não gostei de vê-la a rir-se com o Dário e decidi pedir qualquer coisa para beber.
-Queres dançar? – Perguntou-me o Manuel.
Não. Não queria, mas achei que estava a ser parva a ficar ali sentada a noite toda e obriguei-me a levantar-me e dançar com o Manuel. Nunca o imaginei a ser divertido mas pelos vistos era. Bem, pelo menos quando calhava.
Ele só fazia maluquices e eu ria-me e tentava fazer também umas maluqueiras. A Jéssica olhou para mim e piscou-me o olho. Eu fingi que não vi.
Passado um bocado a Jéssica veio ao pé de nós e disse a gritar ao irmão:
-Manel vou sair daqui um bocado com o Dário, ok?
-Não faças asneiras.
-Ok.
Fiquei chateada. Já sabia no que é que aquilo ia dar.
-E tu? Queres que te leve a casa?
-Nem por isso. Mas também estou a ficar enjoada de estar aqui dentro, queres ir dar uma volta?
-Está bem.
Saí-mos e começámos a andar por sítios ao acaso mas eu conhecia-os a todos.
-Tu gostavas do tipo que trouxeste contigo não gostavas?
-Tinha esperança de que pudesse ter qualquer coisa com mas a tua queridíssima irmã teve a mesma ideia. Mas eu mal o conhecia, só o tinha visto uma vez antes numa noite um bocado estranha – e relatei-lhe a conversa que tinha tido com o Dário.
Quando acabei o relato ele riu-se o que me surpreendeu.
-E tu foste na canção do bandido. Minha tontinha ele só estava a meter daquelas conversas típicas que os homens põem para seduzir as rapariguitas. Agora, sabendo que ele também te é desconhecido a ti estou a ficar preocupado com a minha irmã. Espero bem que o tipo não tenha más intenções.
Senti que o Manuel tinha feito pouco de mim e fiquei um pouco ofendida.
Passado um bocado parámos de andar e sentámo-nos.
-Achas-me estupida? – perguntei.
-Acho que és muito miúda e que qualquer rapariga da tua idade cometeria os teus erros por isso não te preocupes com isso.
Questionei-me quantos anos teríamos de diferença. Ele devia ter uns dezoito e eu uma criancinha de treze. Cinco anos de diferença apesar de tudo não era muito e achei que ele se estava a armar em meu pai. De qualquer maneira foi bom conhecer o Manuel. Afinal não era assim muito frio apesar de se armar em superior até gostei dele.